Mulheres, energia e clima – 1ª edição

O IEI Brasil apresenta a primeira edição do registro do trabalho e da trajetória de mulheres que se destacam na área de energia e clima. A ação é uma homenagem, realizada em parceria com o grupo Gênero e Justiça Climática do Observatório do Clima (OC), em março de 2024, mês do 8 de março. Confira, a seguir, o perfil das cinco mulheres escolhidas para representar a atuação feminina na área.

Bruna Lopes Bispo

 

Graduada em Arquitetura e Urbanismo, Bruna conta que sua jornada até a área de energia e clima foi marcada por uma trajetória que se entrelaça com o compromisso de levar suas habilidades profissionais a territórios que se encontram às margens das cidades, sem condições dignas de exercer o bem viver.

Em 2018, Bruna deu os primeiros passos nesse caminho ao ingressar na área de Assessoria Técnica em Habitação de Interesse Social (ATHIS). A sua atuação concentrou-se em melhorias habitacionais, mobilização social e implementação de metodologias participativas. Ao longo desse percurso, ela se aproximou de movimentos sociais organizados, o que proporcionou uma compreensão mais aprofundada sobre o direito à moradia e à cidade.

Como parte desse engajamento, hoje Bruna integra projetos que contribuem para a construção coletiva de uma perspectiva de transição energética que seja justa e popular. Os projetos compartilham de uma base comum centrada no reconhecimento dos direitos à moradia e à cidade, os quais ela diz tem defendido ao longo dos anos em sua atuação profissional.

Hoje Bruna trabalha como assistente de projeto do Instituto Pólis, dentro do eixo Socioambiental. Por meio do trabalho, auxilia na construção de projetos que envolvem essa efetivação do direito à moradia e à cidade por meio de uma transição energética justa e popular. São projetos que, de acordo com ela, representam uma abordagem integrada que reconhece a interconexão entre questões sociais, ambientais e energéticas.

Bruna também atua na elaboração de estratégias, na implementação de ações práticas e no engajamento das comunidades envolvidas. Ela diz estar comprometida, ao fazer isso, não apenas em facilitar a implementação bem-sucedida dos projetos, mas também em promover uma abordagem participativa e inclusiva que respeite e valorize a diversidade de vozes e experiências no trabalho em prol de um futuro mais sustentável e justo.

Dorinha Nonato

 

Dorinha é uma liderança jovem do Quilombo da Serra dos Rafaéis, localizada na Chapada do Araripe, na divisa entre Pernambuco e Piauí. Dorinha tem hoje 28 anos e conta que começou a trabalhar mais fortemente dentro do movimento quilombola e nas ações da comunidade em 2020. Ela diz que esse ano é o marco de quando ela abraçou a luta pelos direitos da comunidade e as ações do movimento quilombola na Associação do Quilombo.

 

A comunidade quilombola em que vive possui mais de 100 anos de história e tradição. Dorinha relata que a Associação havia sido fundada pelo pai dela, auxiliado por ela, ainda de fora, nas pesquisas e orientações. Desde 2021, ela assumiu a responsabilidade na Associação enquanto juventude e atua dentro da comunidade fazendo trabalho social, participando de eventos, trazendo melhorias e buscando direitos. Segundo ela, o objetivo é fazer com que a comunidade seja vista e respeitada por ser quem é, com sua cultura, tradição, trajetória e história de vida.

 

Em 2021, um mega empreendimento de energia eólica chegou em seu território e impactou diretamente a comunidade. O empreendimento, inclusive, cortava a comunidade em duas. Dorinha e a comunidade começaram, então, a travar uma luta de igualdade de direitos com a empresa, para que ela respeitasse a cultura da comunidade, o território e os direitos previstos por lei na Constituição.

 

Foi quando Dorinha conheceu a rede Nordeste Potência e passou a fazer parte dela a partir de um projeto realizado com apoio do Fundo Casa. Desde então, Dorinha vem atuando na temática de energias renováveis e territórios tradicionais, pautando o que é energia renovável, o que é transição energética, quais os impactos desses empreendimentos na sua comunidade e os potenciais impactos em outras comunidades.

 

Em meio aos conflitos com a empresa, eles construíram o primeiro protocolo de consulta livre, prévia e esclarecida do estado do Piauí, um importante instrumento para garantir uma transição energética justa e que respeite povos e comunidades tradicionais.

 

Hoje, Dorinha conta que faz com a comunidade um trabalho de divulgação do protocolo desenvolvido por eles e leva as experiências e vivências para que outras comunidades não passem pelos problemas da forma como eles passaram. Isso poderia, segundo ela, evitar conflitos da comunidade com a empresa, conflitos entre famílias, dentro da própria associação e outros muitos conflitos que surgiram a partir dessa experiência e que são enfrentados por eles até hoje.

Jussara Vanessa Salgado Batista

 

Jussara possui bacharelado interdisciplinar em Ciência, Tecnologia e Engenharia Física. Ela iniciou sua jornada profissional em 2019 como técnica de energia do Projeto Saúde e Alegria (PSA), atuando em comunidades remotas da Amazônia que não possuem acesso à energia da rede.

 

Segundo ela, trabalhar nesse contexto é desafiador e cada intervenção tem que ser projetada considerando os aspectos ambientais, tecnológicos, financeiros e logísticos, respeitando os saberes, tradições e modo de vida dos povos da floresta. Existem também desafios atrelados ao gênero e é necessário criar espaços para que mais mulheres participem das discussões e formações técnicas na área de energia e clima, seja em comunidades, escolas ou no meio acadêmico.

 

Jussara tem cinco anos de experiência em projetos com o uso de fonte renovável, principalmente energia solar fotovoltaica off grid, que abordam, também, o uso e a gestão da energia, modelos sustentáveis de eletrificação para a Amazônia e mudanças climáticas. Ela explica que o acesso à energia nessas localidades também representa o acesso a outras políticas públicas, como saúde, educação e saneamento/água.

 

Hoje ela atua no Projeto Saúde e Alegria como coordenadora do Programa de Infraestrutura Comunitária, que tem como objetivo contribuir no aprimoramento das políticas de universalização do saneamento, acesso à água, energias renováveis e inclusão digital. Segundo ela, a experiência de atuar diretamente na ponta, acompanhando e implementando os projetos, e a oportunidade de crescimento profissional na instituição a direcionaram até esse cargo. Em seu trabalho ela desenvolve ações relacionadas à gestão dos projetos e à coordenação das atividades em campo e estabelece diálogos com doadores, parceiros estratégicos, redes e organizações de base a fim de propor soluções sustentáveis para as áreas de atuação do Programa.

Samira Sana Fernandes de Sousa Carmo

 

Samira é engenheira eletricista, formada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com especialização em energia eólica pela Universidade de Kassel, da Alemanha, e mestrado profissional em Políticas Públicas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

 

Samira iniciou seu trabalho no Ministério de Minas e Energia (MME) em 2003 e conta que chegou lá ainda recém formada, em sua primeira oportunidade de trabalho. Foi no MME que ela começou a interagir com a área de energias renováveis, especialmente no âmbito da regulamentação do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa). Foi no MME em que ela também se aprofundou na temática do clima, e começou a atuar na regulamentação desses temas, com o início da implementação do Protocolo de Quioto e a possibilidade de implementação de projetos no âmbito do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL).

 

Em seguida, Samira passou alguns anos no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação trabalhando com o desenvolvimento tecnológico das diferentes tecnologias de geração de energias renováveis e de consumo energético. Desde 2018 voltou a atuar no MME, agora na área de eficiência energética, apoiando o desenvolvimento de políticas para a conservação e uso racional de energia.

 

Todo esse caminho, segundo ela, foi repleto de desafios, busca constante por aperfeiçoamento, conhecimento, persistência e muito aprendizado. Ela diz se sentir privilegiada por ter tido sempre muito apoio em sua caminhada, com profissionais muito competentes e generosos que a incentivaram a seguir crescendo, em especial as mulheres, que inspiraram com atuações singulares.

 

Seu trabalho atual, na área de eficiência energética, é como coordenadora-geral no Departamento de Informações, Estudos e Eficiência Energética da Secretaria Nacional de Transição Energética e Planejamento do MME. Nesse cargo, Samira trabalha na implementação das políticas e programas governamentais de promoção da eficiência de máquinas, equipamentos e edifícios consumidores de energia, bem como na implementação de ações para a conservação e o uso racional de energia.

 

Samira explica que a área de eficiência energética tem sido considerada um dos pilares da transição energética, pelo seu grande potencial de contribuir com a redução de emissões de gases de efeito estufa, ao mesmo tempo em que promove a redução dos custos necessários a investimentos em novas fontes energéticas. Ela atua na política de índices mínimos de eficiência energética, na gestão do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), no desenvolvimento de projetos de cooperação internacional para a promoção da eficiência energética e também na representação institucional do MME nessa temática em fóruns e grupos de trabalho nacionais e internacionais.

Suely Maria Machado Carvalho

 

Suely é formada em Física pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e possui mestrado e PhD (o equivalente ao doutorado brasileiro) pela Purdue University, dos Estados Unidos. Fez pós-doutorado em Michigan, no Cyclotron Laboratory, do Departamento de Energia dos Estados Unidos.

 

Trabalhou no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), em São Paulo, na área de pesquisa tecnológica, eficiência energética e alternativas amigas do ozônio e do clima. Foi também chefe de divisão de Qualidade do Ar na então Secretaria de Meio Ambiente em Brasília, onde era coordenadora do Programa Nacional de Controle de Emissões de Veículos Automotores, em parceria com a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). Posteriormente foi diretora de Transferência de Tecnologia da Cetesb/Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo, onde criou os Programas Estaduais de Ozônio e de Clima do estado.

 

Foi selecionada por concurso público internacional para ser diretora da Unidade do Protocolo de Montreal e Químicos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em Nova York. Foi responsável pelos projetos globais do PNUD, financiados pelo Fundo Multilateral e pela Global Environment Facility (The GEF) em cerca de 100 países em desenvolvimento e em países com economias em transição.

 

Suely é hoje consultora técnica independente e especialista sênior do Painel de Avaliação Econômica e Tecnológica (TEAP) para o Protocolo de Montreal no Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).

 

A pesquisadora recebeu diversos prêmios por sua atuação e contribuição para a proteção da camada de ozônio e clima, entre eles o Global Ozone Award – UNEP Award, dado a especialistas selecionados globalmente e entregue durante a celebração dos 20 anos do Protocolo de Montreal, em Montreal, Canadá.

 

Em setembro de 2023, durante a Climate Week (Semana do Clima) em Nova York, Suely recebeu o Ozone Award (Prêmio Ozônio), do coletivo Guardiões do Planeta, criado pelo filantropo e CEO do Grupo Virgin, Richard Bronson. Suely foi premiada como uma referência da ONU sobre clima, fundamental para demonstrar a viabilidade técnica e econômica de soluções seguras e de baixo carbono para o ozônio e pelo seu sucesso no alinhamento da política governamental para a transformação desse mercado. Segundo a justificativa do Prêmio, Suely ocupou vários cargos seniores protegendo o ozônio e o clima ao longo de mais de 35 anos.